segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

redenção


Há de chegar o dia do abraço sincero, do sorriso aberto e da mão que acolhe.
Tão cheia de si, a familia se desmancha num vento cotidiano, tornando-se a areia que cega os olhos.
A iminência do fim, latejando no coração das pessoas e no medo da solidão.
Eu tenho medo, medo de uma solidão que já sinto.
Incorporo como minha, interiorizo como sendo.
As crianças crescem, os adultos envelhecem, crianças são agora adultos - torcendo para não serem os mesmos- e os adultos velhos cuidam das novas crianças.
Numa confusa musica, o tempo desafina e as pessoas entorpecidas imersas no descaso do presente, fixadas num virá - e nunca veio.
- Nunca ouvi alguem dizer que vive o futuro!
Ouvi dizer que o futuro acabou em dois mil e nove, e o tempo em sua regência frenetica, ensurdeceu-nos e costurou nossas bocas, e lentamente as palavras só podiam ser vistas em gestos, e os gestos cansados de incompreensão calaram, calados esquecemos a palavra e depois a linguagem, nosso cerebro engessou e no cessar do movimento e areia que era pó, como cola, virou movediça  engoliu e calou para sempre os corações que existiram.
Existiu?
Uma casa, as pessoas e os palcos todos foram embora, todos foram e o teatro se encaminha para o fim, caminha para o fim todos os dias.
Lembra que a criança nova vai embora, a criança nova a unica não imersa na areia, - Ainda!
-Ainda!

A pequena vai morar no campo e lá não há espaços para reticências. Só para sol, grama, horta, terra e cavalos.
A criança nova é unica que se salvará, os demais caminham para as cochias com as duvidas e as mazelas. E sós, sós numa familia de individuos, individuos agrupados estão em silêncio o silêncio em volta da mãe que morreu, e todos, sem exceção, tem medo do fim e da casa de repouso.

Mas a criança nova não.
A criança nova caminha agora para a beleza, e há inveja dos que caminham para a velhice.
Dá adeus, aprenda a dar adeus. Á Deus.

Mas não o que ama, o que pune e vigia e castiga.
'E castigou você, ó querida virgem, teu marido foi embora e não aprendeste nada?'
Você orou, eu sei! Orou, com medo da solidão roer seus ossos, e seu corpo um muco letárgico amorfo e fetido, e ninguém, ninguém testemunharia seu fim.
Não há mais amor, depois de vinte sete anos de convivência não há mais amor, só um punhado de cordas circundando os corpos.

Mas há de chegar o dia do abraço sincero, do sorriso aberto e da mão que acolhe.  
E será a criança nova, a criança flor do campo, a criança, com suas mãos redentoras dará ao tempo a chance de perdoar, dará Á Deus sua dispensa e com todo o seu carinho exorcizará os demonios que trancam a passagem da areia movediça.
A criança que dorme sem a mãe calará as dores do passado, a criança que corre no campo e fala mamãe dirá a palava final, a palavra secreta, a palavra mágica, que esconde por trás de seus olhos enigmaticos e ainda cifrada corre suas veias e não identificavel, tão ela e tão somente ela pode perdoar e dar perdão a toda a história da familia sangrenta, a familia dos contrarios, ao descaminho e as linguagens esquecidas.

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